Um estudo da Universidade de St Andrews, na Escócia, publicado em 18 de agosto na revista Current Biology, analisou o desempenho de sete Haenyeo — mergulhadoras tradicionais da ilha de Jeju, Coreia do Sul — e concluiu que elas permanecem debaixo de água por períodos superiores aos registados em alguns mamíferos aquáticos, como os castores.
Monitorização inédita do comportamento e da fisiologia
As participantes, com idades entre 62 e 80 anos, foram acompanhadas enquanto recolhiam ouriços-do-mar. Os investigadores utilizaram um dispositivo normalmente aplicado no estudo de mamíferos marinhos para registar ritmo cardíaco, níveis de oxigénio, profundidade e duração de cada imersão.
Os dados mostram que, ao longo das duas a dez horas diárias de trabalho no mar, as Haenyeo passaram 56 % do tempo submersas, a maior proporção alguma vez observada em humanos. O valor ultrapassa o comportamento de castores e aproxima-se de espécies como lontras-marinhas e leões-marinhos. Apesar disso, o total de horas de mergulho por dia ficou abaixo do verificado nesses animais.
Adaptação singular ao mergulho frequente e raso
Diferente do chamado “reflexo de mergulho” típico dos mamíferos — caracterizado por redução do batimento cardíaco e desvio de sangue dos músculos para órgãos vitais — estas mulheres exibiram frequência cardíaca elevada e apenas ligeira diminuição de oxigénio no cérebro e nos músculos. Os autores sugerem que o padrão de mergulhos curtos, rasos e frequentes pode ter levado a uma forma alternativa de adaptação fisiológica.
Património em risco
Reconhecidas pela UNESCO como Património Cultural Imaterial, as Haenyeo representam uma tradição secular de mergulho livre para a recolha de marisco. Segundo a investigação, mais de 90 % das praticantes têm agora mais de 60 anos, o que ameaça a continuidade desta atividade e das adaptações únicas observadas.

Para Chris McKnight, investigador sénior do Scottish Oceans Institute e autor principal do trabalho, comparar os resultados humanos com dados de espécies aquáticas “ajuda a contextualizar o quão extraordinárias são estas mergulhadoras”. A coautora Melissa Ilardo, da Universidade do Utah, sublinha a importância de documentar o que pode ser “a última geração de Haenyeo”, reforçando o valor científico e cultural do estudo.
As conclusões evidenciam a resiliência fisiológica humana e destacam a necessidade de preservar tanto o conhecimento tradicional quanto a biodiversidade cultural associada ao mergulho livre na ilha de Jeju.