Inteligência artificial no Judiciário passa a seguir regras do CNJ; veja limites e permissões

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou, em março, a Resolução 615/2025, que define parâmetros para o uso de inteligência artificial (IA) em todos os ramos do Judiciário. O texto padroniza procedimentos em tribunais estaduais, federais, do trabalho e Cortes superiores, estabelecendo tanto as possibilidades quanto as vedações para a adoção de sistemas automatizados na elaboração de documentos e no apoio à tomada de decisões.

Identificação das peças produzidas

Uma das diretrizes centrais da resolução determina que sentenças, despachos e demais manifestações processuais elaborados com auxílio de IA não precisam vir acompanhados de indicação específica sobre a utilização da tecnologia. Na prática, o público externo não poderá distinguir se determinado ato judicial foi redigido exclusivamente por um magistrado ou se contou com apoio de algoritmos. O CNJ entendeu que a responsabilidade final permanece integralmente humana, de modo que a sinalização sobre ferramentas utilizadas não acrescentaria transparência efetiva ao processo.

A IA como instrumento auxiliar

O regulamento deixa expresso que as soluções tecnológicas funcionam apenas como suporte. Fica proibido o uso autônomo da IA para decidir litígios ou produzir conclusões sem a intervenção do julgador. Dessa forma, todas as etapas do procedimento—da análise das provas à redação da decisão final—devem permanecer sob controle do magistrado, que responde pela validade jurídica dos atos.

Exemplo prático no Rio Grande do Sul

No Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), a adoção de uma ferramenta de IA demonstrou o potencial de aceleração de fluxos. Em cerca de 30 dias, o sistema gerou mais de 95 mil minutas de decisões, das quais milhares foram efetivamente publicadas após conferência dos juízes. O volume indica que, mesmo atuando somente como redator preliminar, o recurso já influencia o ritmo de trabalho nas varas estaduais.

Riscos reconhecidos pelo CNJ

Logo na abertura da Resolução 615, o CNJ lista perigos associados ao uso irrestrito de IA generativa. Entre eles, destacam-se eventuais ameaças à soberania nacional e a possibilidade de ampliação de vieses discriminatórios presentes em bases de dados. Para mitigar esses problemas, o órgão fixou salvaguardas específicas, voltadas principalmente à proteção de direitos fundamentais.

Proibições específicas

O artigo 10 elenca práticas vetadas. Os sistemas não podem avaliar traços de personalidade, emoções ou comportamentos com a finalidade de prever crimes ou estimar a reincidência de pessoas investigadas ou processadas. Também está vedada a classificação ou ranqueamento de indivíduos com base em características pessoais ou em sua inserção em grupos sociais. Além disso, a norma impede o uso de reconhecimento biométrico para detectar sentimentos nos participantes do processo.

Monitoramento e comunicação de incidentes

Outra obrigação imposta aos tribunais é a notificação ao CNJ, no prazo máximo de 72 horas, sobre eventos adversos relacionados às aplicações de IA. A medida abrange desde falhas técnicas até episódios de “alucinação”, quando o sistema produz informações inexatas ou sem respaldo nos autos. O objetivo é permitir a correção rápida de erros e a avaliação contínua da segurança das soluções adotadas.

Governança e responsabilidade

Apesar da autonomia de cada corte para implementar ferramentas próprias, a resolução estabelece que todos os projetos deverão observar padrões de governança, transparência algorítmica e avaliação de impacto. Os tribunais precisam manter comitês internos de supervisão, elaborar relatórios periódicos sobre o desempenho dos sistemas e disponibilizar informações que permitam auditoria independente, sempre respeitando sigilo judicial quando aplicável.

Próximos passos

Com a publicação da Resolução 615/2025, o CNJ busca uniformizar práticas e reduzir disparidades no tratamento de processos assistidos por IA. A expectativa é que, nos próximos meses, os tribunais revisem contratos, ajustem fluxos de trabalho e treinem equipes para cumprir integralmente as diretrizes. O panorama indica que a inteligência artificial seguirá como aliada na celeridade processual, mas dentro de limites claros, sob supervisão humana e com mecanismos de controle destinados a preservar a neutralidade e a confiança no sistema de Justiça.

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