Met Éireann, o serviço meteorológico nacional da Irlanda, vai financiar seis iniciativas académicas com um total de €2,8 milhões para melhorar a capacidade do país de antecipar fenómenos extremos e reduzir riscos climáticos. Os projetos selecionados pertencem à University of Galway (UG), à University College Cork (UCC) e à Maynooth University, e foram aprovados no âmbito do Met Éireann Research Call 2024.
Objetivo: serviços climáticos mais robustos
A chamada competitiva integra o Weather and Climate Research Programme, que procura reforçar a investigação nacional em meteorologia e climatologia através de estudos de impacto elevado. O financiamento agora atribuído concentra-se em três eixos principais:
- Modelos avançados de previsão de cheias costeiras e fluviais;
- Segurança e resiliência do sistema energético face à dependência de renováveis;
- Análise de eventos climáticos extremos, atuais e históricos, para apoiar políticas de adaptação.
Projetos financiados e montantes
Entre as propostas vencedoras, destacam-se três investigações de grande escala com valores superiores a €250 mil:
Integrated Multi-model Multi-hazard Flood Forecasting (IMUFF) – University of Galway
Liderança: Dr. Indiana Olbert
Financiamento: €399 976 (duração de dois anos)
O que faz: desenvolve um sistema integrado de previsão que combina modelos processuais e técnicas de inteligência artificial para antecipar cheias compostas, isto é, ocorrências simultâneas de inundações fluviais e costeiras. Ao fundir várias fontes de dados, a equipa pretende fornecer alertas mais fiáveis e tempestivos às comunidades vulneráveis.
ClimEnergise – University College Cork
Liderança: Dr. Vahid Aryanpur
Financiamento: €299 546
O que faz: analisa flutuações climáticas compostas e isoladas que afetam produção e procura de eletricidade, especialmente em redes dominadas por eólicas e solares. O objetivo é traduzir esses padrões em estratégias concretas para garantir segurança de abastecimento, controlar custos e cumprir a meta nacional de neutralidade carbónica até 2050.
Extremes Across Climates and Timeframes (EXACT) – Maynooth University
Liderança: Prof. Conor Murphy
Financiamento: €599 704
O que faz: cruza registos meteorológicos históricos extensivos com projeções de alta resolução produzidas pelo modelo TRANSLATE do próprio Met Éireann. A análise pretende mostrar como cheias, secas e ondas de calor evoluíram ao longo do tempo, com especial atenção a extremos compostos, como chuvas intensas após períodos de seca.
Além destes, outras três iniciativas receberão apoio para temas complementares:
Dr. Paraic Ryan (UCC) – estudo sobre resiliência infraestrutural perante eventos meteorológicos extremos;
Dr. Paul Holloway (UCC) – criação de serviços climáticos transversais a vários setores socioeconómicos;
Dr. Paul Nolan (UG) – produção e curadoria de dados essenciais para estudos climáticos futuros. Os valores atribuídos a estes projetos não foram divulgados.
Risco crescente de cheias compostas
As inundações combinadas, nas quais a subida do nível do mar coincide com chuvas torrenciais que levam rios a transbordar, são uma preocupação crescente nas zonas costeiras da Irlanda. Segundo os investigadores da University of Galway, os sistemas de alerta atuais não captam adequadamente a interação entre marés, ondas e descarga fluvial, levando a avisos tardios ou imprecisos. O IMUFF propõe integrar modelos hidrodinâmicos com algoritmos de aprendizagem automática para melhorar a resolução espacial e temporal das previsões.
Entre os benefícios esperados estão:
- Redução de falsos alarmes que prejudicam a confiança pública;
- Antecipação suficiente para ativar planos de evacuação;
- Dados sólidos para orientar investimentos em barreiras e drenagem.
Sistema energético sob pressão climática
Com a eletrificação da economia e a expansão das renováveis, oscilações climáticas tornaram-se fator determinante na estabilidade da rede. O ClimEnergise pretende quantificar o impacto de episódios como calmarias prolongadas, tempestades intensas e variações de temperatura na produção de energia e no pico de consumo. A equipa de Cork vai combinar cenários climáticos futuros com dados operacionais do sistema elétrico, definindo indicadores de risco que ajudem reguladores e operadores a planear capacidade de reserva e armazenamento.

Os resultados poderão influenciar decisões sobre:
- Localização de novas baterias de larga escala;
- Investimento em interligações internacionais;
- Adoção de tarifas dinâmicas que equilibrem oferta e procura.
Mapear extremos passados para preparar o futuro
No projeto EXACT, investigadores de Maynooth vão digitalizar e analisar mais de 150 anos de observações meteorológicas, integrando-as com projeções de alta resolução até ao final do século. O cruzamento destes conjuntos permite identificar tendências de eventos complexos, como ondas de calor seguidas de precipitação extrema, que podem causar deslizamentos de terra e falhas em infraestruturas.
Segundo o Prof. Murphy, compreender a sequência e a combinação de perigos climáticos é crucial para “traduzir ciência em decisões práticas”. A equipa vai produzir storylines acessíveis—narrativas que descrevem cenários plausíveis de risco—para apoiar municípios, seguradoras e entidades de proteção civil na definição de planos de adaptação.
Posicionamento de Met Éireann
Eoin Moran, diretor de Met Éireann, destacou que os seis projetos “representam contributos críticos para os esforços nacional e internacional de enfrentar as alterações climáticas, os fenómenos extremos e a sustentabilidade ambiental”. Ao reforçar parcerias com as três universidades, o organismo pretende criar um núcleo de competência que consolide a liderança irlandesa em modelação climática e hidrológica.
Além do apoio financeiro, Met Éireann fornecerá dados de observação, acesso a capacidade de computação e consultoria técnica. A expectativa é que os resultados alimentem serviços operacionais, como o Sistema Nacional de Alerta de Cheias, e orientem políticas públicas em transportes, agricultura e planeamento urbano.
Próximos passos
Cada equipa iniciará trabalho de campo e desenvolvimento de modelos já no segundo semestre de 2024. Entre as metas intermédias estão:
- Protótipos de previsão de cheias compostas em três bacias-piloto até meados de 2025;
- Relatórios sobre vulnerabilidade do sistema elétrico a extremos climáticos antes do inverno de 2026;
- Portal online com cronologia de eventos históricos e projeções de extremos até 2027.
Os investigadores planeiam divulgar resultados preliminares em conferências internacionais e colaborar com agências europeias para harmonizar metodologias. Se as metas forem atingidas, as ferramentas poderão ser replicadas noutros países costeiros, reforçando a evidência de que investimento em ciência climática gera retornos diretos em segurança e sustentabilidade.